domingo, abril 22, 2007

Nota Pastoral sobre o Escutismo, no centenário da sua fundação

1. O Escutismo foi fundado pelo general inglês Robert Baden-Powell em 1907 (primeiro acampamento, na ilha de Brownsea, 1907). Como se verificou, correspondia bem às características básicas da sociologia e pedagogia de crianças, adolescentes e jovens, tendo crescido rapidamente, da Inglaterra para o Mundo. Actualmente, a Organização Mundial do Movimento Escutista estende-se por mais de duzentos países e territórios.
O método escutista desenvolve a vontade de conhecer e participar, da natureza para a sociedade. Tal acontece sempre em pequenas comunidades, coetâneas e sucessivas (bandos, patrulhas e equipas), de crianças, adolescentes e jovens (lobitos, exploradores, pioneiros e caminheiros, na designação do Corpo Nacional de Escutas). Com isto, Baden-Powell foi ao encontro quer do espírito de aventura quer da vontade de integração e pertença dos mais novos. Partindo daí, sugeriu-lhes metas positivas de crescimento pessoal e comunitário e desenvolveu-lhes o sentido da responsabilidade por si e pelos outros, bem como o gosto pela vida ao ar livre e em grupo.
Baden-Powell reconhecia a natureza como obra divina e nos seus escritos manifesta-se uma religiosidade espontânea. A sua obra fundamental – Escutismo para rapazes (Scouting for boys) – está repassada de gratidão e responsabilidade em relação à criação, incutindo nos escuteiros idênticos sentimentos. Quando faleceu no Quénia, a 8 de Janeiro de 1941, deixou uma “última mensagem”, onde se encontram as seguintes frases, bem identificativas da “alma do Escutismo”: “Creio que Deus nos colocou neste mundo encantador para sermos felizes e apreciarmos a vida. A felicidade não vem da riqueza, nem simplesmente do êxito de uma carreira, nem dos prazeres. […] O estudo da natureza mostrar-vos-á as coisas belas e maravilhosas de que Deus encheu o mundo para vosso deleite. […] Mas o melhor meio para alcançar a felicidade é contribuir para a felicidade dos outros. Procurai deixar o mundo um pouco melhor do que o encontrastes e, quando chegar a vez de morrer, podeis morrer felizes sentindo que ao menos não desperdiçastes o tempo e fizestes todo o possível por praticar o bem. Estai preparados desta maneira para viver e morrer felizes […], e Deus vos ajude a proceder assim”.
Não sendo, no seu conjunto, um movimento confessional no sentido estrito, porque Baden-Powell o via como meio de aproximar jovens de vários credos, no sentido da paz mundial, é, de raiz, uma pedagogia fundamentalmente religiosa, pelas convicções pessoais e expressas do fundador: “O homem de pouco vale, se não acreditar em Deus e obedecer às suas leis. Por isso todo o escuteiro deve ter uma religião”. Aliás, impregnou os seus escritos do ideal da antiga cavalaria cristã e da figura de São Jorge, que deu como referência a todos os escuteiros: “S. Jorge comemora-se a 23 de Abril. Nesse dia todos os bons escuteiros se lembram de meditar sobre a sua promessa e lei”.
Com o correr do tempo e o assentimento de Baden-Powell e dos respectivos responsáveis religiosos, foram surgindo organizações escutistas confessionais, a par de outras interconfessionais.
2. A Igreja Católica reconheceu as virtualidades do Escutismo para a formação integral da juventude, dento da sua confessionalidade específica. Em Portugal, o Escutismo Católico nasceu por iniciativa de D. Manuel Vieira de Matos, arcebispo de Braga, que ficara vivamente impressionado com a participação de milhares de escuteiros no Congresso Eucarístico Internacional de 1922, em Roma. Com o nome de Corpo de Scouts Católicos Portugueses, nasceu em Braga, em 1923, o actual Corpo Nacional de Escutas. Em 1925 o Papa Pio XI encorajou a iniciativa e o seu progresso. Em 1927, D. Manuel Vieira de Matos já podia dizer: “O Escutismo é a maior obra católica no meu país”.
Tendo obtido reconhecimento das autoridades públicas em 1923 e 1925, persistiu como movimento juvenil autónomo em 1936, graças ao empenho dos seus dirigentes e do Episcopado. Em 1983, o Corpo Nacional de Escutas – Escutismo Católico Português foi reconhecido pelo Estado como Instituição de Utilidade Pública.
Vivendo sobretudo da generosidade dos seus dirigentes, entre os quais de muitos padres assistentes, o Corpo Nacional de Escutas sobressai na Igreja e no País como instituição educativa ímpar, pela capacidade de adaptação e pela persistência ao longo dos vários regimes políticos e enquadramentos sócio-culturais, evidenciando o acerto e a fecundidade do método, especialmente quanto à evangelização dos mais novos. Conta actualmente com cerca de um milhar de Agrupamentos, geralmente paroquiais, com cerca de 70.000 elementos, e milhares de dirigentes adultos.
Neste ano centenário, saudamos todos os escuteiros portugueses, do Corpo Nacional de Escutas e das outras Associações que seguem a pedagogia de Baden-Powell, reiterando a nossa admiração pela extraordinária obra realizada e a nossa confiança quanto ao futuro.
3. A 29 de Dezembro de 1995, a Conferência Episcopal Portuguesa publicou uma Exortação pastoral sobre o Escutismo, escola de educação humana e cristã, na comemoração do centenário do nascimento de Monsenhor Avelino Gonçalves, grande colaborador de D. Manuel Vieira de Matos na fundação do Corpo Nacional de Escutas.
Aí se reconheceu a actualidade pedagógica do método, bem como a sua convergência na educação da fé e o contributo numa pastoral renovada. Será certamente oportuno reler este documento, revendo, doze anos depois, as indicações nele dadas e avaliando o respectivo cumprimento. Destaquem-se, em especial, as seguintes considerações: “Como procurámos esclarecer oportunamente, verifica-se uma convergência natural entre o ideal escutista e o cristianismo. A fé cristã fortalece o projecto educativo do Escutismo e este favorece a educação da atitude da fé. Recomendamos, por isso, aos dirigentes e assistentes que […] valorizem a raiz e a perspectiva cristã do Escutismo como alicerce da educação integral”.
Felicitando vivamente todos os escuteiros, a Conferência Episcopal Portuguesa associa-se ao centenário do Escutismo, dando graças a Deus por tantos benefícios que trouxe aos milhões de jovens que passaram pelas suas organizações, pelo contributo que deu e continua a dar à fraternidade e à paz entre os povos e à dimensão religiosa que desenvolve, na fidelidade ao pensamento e proposta pedagógica de Baden-Powell.

Fátima, 19 de Abril de 2007

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